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Carta para a Geilza de 16 anos:

Hoje minha mãe recebeu alta da oncologista, após 10 anos.

Foram muitas sequelas emocionais desde o diagnóstico do câncer de mama. Ansiedade, que rasgava meu estômago, minha consciência e meu coração. O medo do que viria, as incertezas.

Acredito que, se eu tivesse o poder de escrever minha história, eu não teria escolhido esse enredo. Mas existe um Ser que é soberano e entende que precisávamos disso. Ele enxerga o futuro com clareza e sabe que temos muitas imperfeições a corrigir. E eu acolhi. Acolhi essa experiência aos 16 anos. Muitas vezes, eu cobicei a vida das minhas amigas que só tinham o vestibular para se preocuparem. E ainda assim reclamavam. Meus dias foram um misto de vestibular, quimioterapia, perda de cabelos, o medo de ficar sozinha e a impotência. De não poder fazer nada, mudar as coisas como um passe de mágica. Sem saber se mamãe veria minha formatura, meu mestrado, minha aprovação em concurso.

Hoje, reconheço que a vida e as circunstâncias me fizeram uma filha melhor. Em 10 anos, eu vivi com a responsabilidade de cuidar da minha mãe, de segurar a ansiedade, a tristeza, a fraqueza. Alguns dias, a gente precisa engolir o choro e seguir. Mas isso traz sequelas. E elas ainda estão aqui.

Acredito que cumpri minha missão como filha - cuidadosa, exagerada e ansiosa. Obviamente, continuarei sendo tudo isso. Poderia ter cumprido de forma mais majestosa, mas eu também sou limitada, e ainda preciso me perdoar pelas fraquezas. Fiz o que eu podia, com o repertório que eu tinha. Seguirei aprendendo.

Hoje, sou mais humana, mais empática, mais atenta aos sentimentos dos outros. Erro muito, sinto todas as emoções negativas que um ser humano sente. Mas eu choro com a dor do outro e tento fazer o máximo possível para amenizar os sofrimentos.

Nós nunca sabemos o que vamos passar. Para uma pessoa controladora como eu, é desgastante a incerteza do futuro. Mas eu sigo como aprendiz, tentando acolher o que a vida me traz, com resignação, assumindo que posso ser frágil.

Deixo essa mensagem para você, que já teve câncer, que está enfrentando o tratamento e que terá, e ainda não sabe. Inclusive eu. Pode acontecer a qualquer momento com cada um de nós. Tudo passa! A gente aprende, que a vida é isso. Que estamos aqui pra servir, independente de credo.

Agradeço imensamente a todos os médicos e médicas que acompanham mamãe. À Dra. Renata Loureiro (Oncologista), Dra. Cristiane Santos (Mastologista), Dra. Geruza Guimarães (Ultrassonagrafia), Dra. Imara Queiroz (Cardiologista), Dr. Aurélio Ventura (Oftalmologista), Dra. Gorete Pinto (Ginecologista), meu agradecimento e admiração. Agradecimento especial a Samara (Nutricionista).

Dedico esse texto, junto com ele todas as minhas memórias, minhas feridas e cicatrizes a todos os que passaram por isso. Como protagonistas ou coadjuvantes (como eu). Em especial, a três pessoas que entraram em outro vagão na viagem da vida. Minha avó Marcelina, que não teve tempo e nem possibilidades de tratamento. Meu padrinho Adeilton, que viveu até o último minuto louvando a Deus em meio ao câncer. E meu amigo Rodrigo, que eu tive a oportunidade de me despedir, mas não o fiz, porque não sabia que a leucemia me tiraria essa chance 10 dias depois.

Agradeça o dia de hoje e todos os dias da sua vida. Na saúde e na doença. Ajude as pessoas e tente relevar as pedrinhas do caminho. Se agora, você está vivo, você e os seus estão bem e tem um teto e comida em sua mesa, você é um privilegiado.

Com lágrimas e um nó desfeito na garganta,

Geilza.

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